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O meu encontro com Jorge Amado – por Francisco Noa

Já há muito ouvia falar do autor e das suas histórias, quando em finais da década de 70, li, pela primeira vez, uma obra sua e que iria ampliar e aprofundar o meu conhecimento, mesmo a distância, sobre o Brasil. Sobretudo sobre um certo Brasil, até aí para mim uma autêntica incógnita que, de certo modo, se prolonga até hoje. A minha primeira aproximação a esse Brasil profundo e enigmático tinha sido em meados da década de 70, com o filme Orfeu Negro, de Marcel Camus, de 1959, filmado nas favelas do Rio de Janeiro, em pleno Carnaval, e que deixou arregalados, pela descoberta que então fazia, os meus olhos então adolescentes.

O romance Jubiabá foi, pois, uma revelação de uma realidade que teve o condão de me deixar ligado a um mundo que ao mesmo tempo que me era profundamente desconhecido e desconcertante, me era tão próximo e tão familiar. O fato de os protagonistas serem dominantemente negros, com a sua origem africana bem vincada no desembaraço, na liberdade interior, no despojamento material, na espontaneidade, na alegria, na fraternidade e num misticismo entranhado concorria para que todo aquele mundo, de repente, fizesse parte de mim e eu dele.

O Morro do Capa Negro, onde o moleque Antônio Balduíno brincou e cresceu, era a Mafalala que me surgia inteira e palpitante na minha infância, no colorido das suas gentes, na animação do cotidiano, tranquilo e rotineiro, no fascínio de viver cada dia como se fosse o primeiro e o último, no jogo imprevisível de um destino que a todos irmanava, mesmo tendo em conta as nossas diferenças de cor, de origem e de formação.

A educação de Baldo, feita de histórias e de lendas, fazia dele um irmão mais velho, campeão das malandragens suburbanas, protetor dos fracos, desafiador de todos os tabus, exemplo a imitar no sucesso junto das meninas que desabrochavam para a vida e para o amor.

E a Bahia de Todos os Santos, feito Moçambique, colonial e ancestral, de oprimidos e de pessoas livres, de dominados e de privilegiados, dos rituais ditos pagãos, cristãos, muçulmanos, animistas, da miséria de muitos que davam sentido à vida de poucos, dos sons musicais que enchiam e faziam bailar as nossas existências, dos silêncios sábios dos mais velhos, das transgressões vigiadas e imediatamente punidas…

E o que mais me surpreendia em Jubiabá era perceber que os que normalmente não tinham direito a ter voz nem consciência passaram, pelo menos naquela ficção tão poderosamente real, a ter uma e outra, na galeria inesquecível e simbolicamente apelativa de personagens tão próximas, mas tão distantes como Zé Camarão, Mestre Manuel, Tia Luísa, Lindinalva…

Através de Jubiabá, redescobri as minhas próprias origens, reinterpretei meu lugar no mundo e no tempo. Enfim, foi uma leitura que se traduziu num ritual de passagem significativo e que me ajudou a amadurecer a minha relação com a literatura e com a vida.

Fevereiro de 2012.

Francisco Noa – Ensaísta, pesquisador de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa, Reitor da Universidade Lúrio (UniLúrio), Moçambique.

Citar como:
NOA, Francisco. “O meu encontro com Jorge Amado”. Prólogo in: NOA, Francisco. Uns e outros na literatura moçambicanaEnsaios. São Paulo: Kapulana, 2017. (Série Ciências e Artes)

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LUÍS BERNARDO HONWANA

LUÍS BERNARDO HONWANA

Nasceu em 12 de novembro de 1942, em Chamanculo, subúrbio da cidade de Maputo (Lourenço Marques, no período colonial), e cresceu em Moamba, cidade do interior, onde seu pai trabalhava como intérprete.

1964 foi o ano da primeira publicação de Nós matamos o Cão Tinhoso!. No mesmo ano, Honwana, militante da FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique), foi preso por suas atividades anticolonialismo, e permaneceu encarcerado por quatro anos.

Em 1970, foi para Portugal estudar Direito na Universidade Clássica de Lisboa.

Após a Independência de Moçambique, em 1975, foi nomeado Diretor de Gabinete do Presidente Samora Machel, e participou ativamente da vida política do país.

Em 1982, tornou-se Secretário de Estado da Cultura de Moçambique e, em 1986, foi nomeado Ministro da Cultura de Moçambique.

Em 1987, foi eleito membro do Conselho Executivo da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO).

Em 1991, fundou e foi o primeiro Presidente do Fundo Bibliográfico de Língua Portuguesa.

Em 1994, foi convidado para entrar para o Secretariado da UNESCO e foi nomeado Diretor do escritório regional da organização, com base na África do Sul.

Honwana é membro fundador da Organização Nacional dos Jornalistas de Moçambique, da Associação Moçambicana de Fotografia e da Associação dos Escritores Moçambicanos. Foi diretor executivo da Fundação para a Conservação da Biodiversidade (BIOFUND).

OBRA DA KAPULANA:

Nós matamos o Cão Tinhoso!, 2017 [Vozes da África].

OBRA ORIGINAL:

  • Nós matámos o Cão-Tinhoso! Lourenço Marques [atual Maputo], Moçambique: Sociedade de Imprensa de Moçambique, 1964. 1 ed. Ilustrações de Bertina Lopes (fragmentos de desenho).
  • “Rosita, até morrer” (conto). Vértice, Coimbra, Portugal, v. XXXI, n. 331-32, ago-set, 1971, p. 634-635; Domingo, Maputo, Moçambique, 31 jan. 1982, p. 18.
  • A velha casa de madeira e zinco. Maputo, Moçambique: Alcance Editores, 2017.

EDIÇÕES EM PORTUGUÊS DE NÓS MATAMOS O CÃO TINHOSO!

  • Nós matámos o Cão-Tinhoso! Lourenço Marques [atual Maputo], Moçambique: Sociedade de Imprensa de Moçambique, 1964. 1. ed. Ilustrações de Bertina Lopes (fragmentos de desenho).
  • “Rosita, até morrer” (conto). Vértice, Coimbra, Portugal, v. XXXI, n. 331-32, ago-set, 1971, p. 634-635; Domingo, Maputo, Moçambique, 31 jan. 1982, p. 18.
  • Nós matamos o Cão Tinhoso!, São Paulo: Ática, 1980.
  • Nós matamos o Cão Tinhoso!. São Paulo: Kapulana, 2017 [Vozes da África].
  • A velha casa de madeira e zinco. Maputo, Moçambique: Alcance Editores, 2017.

 TRADUÇÕES DE NÓS MATAMOS O CÃO TINHOSO!:

  • We killed mangy-dog and other Mozambique stories. de Dorothy Guedes. Londres, Inglaterra: Heinemann Educational Books, 1969.
  • Wir haben den Räudigen Hund getötet. Leipzig, Alemanha: Verlag Philipp Reclam, Erzählungen Taschenbuch, 1980.
  • Svarta Händer. Övers Birgitta de Mello Viana. Norsborg, Suécia: Hedenlans, 1980.
  • Nous avons tué le chien-teigneux. Dakar (Senegal), Abidjan (Costa do Marfim), Lomé (Togo): Les Nouvelles Éditions Africaines, 1983.
  • We killed mangy dog and other Mozambique stories. Trad. de Dorothy Guedes (1969). Harare, Zimbábue: Zimbabwe Publishing House, 1987.
  • Matamos al perro sarnoso. Havana, Cuba: Editorial Arte y Literatura, 1988.
  • Nous avons tué le chien-teigneux. de Michel Laban. Paris, França: Editions Chandeigne, 2006.
  • Nosotros matamos al perro-tiñoso. Madri, Espanha: Baobab Editorial, 2008.

EDIÇÕES ESPECIAIS SOBRE NÓS MATAMOS O CÃO TINHOSO!:

  • MACHUDE, Abudo. A recepção crítica de Nós Matámos o Cão-Tinhoso. Maputo, Moçambique: Alcance Editores, 2014.
  • TAVARES, Ana Paula e MENDONÇA, Fátima (Organizadoras). Nós Matámos o Cão-Tinhoso – Jornada comemorativa. Lisboa, Portugal: Fundação Calouste Gulbenkian; Theya Editores, 2014.

PRÊMIOS E DESTAQUES:

  • 1º lugar no Concurso Literário Internacional da revista The Classic, África do Sul, 1965.
  • “Prémio José Craveirinha de Literatura 2014”, Associação dos Escritores Moçambicanos, Moçambique.
  • Nós matamos o Cão Tinhoso! – Classificado entre os “100 melhores livros africanos do século XX” (Creative Writing), 2002. Uma iniciativa da “Zimbabwe International Book Fair”, com a colaboração de African Publishers Network (APNET), Pan-African Booksellers Association (PABA), associações de escritores africanos, conselhos para o desenvolvimento do livro e associações de bibliotecas.
  • Nós matamos o Cão Tinhoso! – em 2021, incluído na lista da FUVEST de obras literárias de leitura obrigatória para os exames vestibulares de 2024 a 2026. 

LINKS DE INTERESSE:

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Lançamento do livro angolano: “Kambas para sempre”, de Maria Celestina Fernandes

Lançamento de livro infantil com contação de história

QUANDO:  12/10 (Dia das Crianças) das 14h

ONDE: Livraria Cultura – Conjunto Nacional – Espaço Infantil

Av. Paulista, 2.073 – Bela Vista –  São Paulo, SP

CEP: 01311-940

https://www.livrariacultura.com.br/loja/livraria-cultura-conjunto-nacional-2000003/evento/lancamento-do-livro-kambas-para-sempre-de-maria-celestina-fernandes-6012440


 

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Pintura digital – Ilustrações de “Kanova e o segredo da caveira”, de Pedro Pereira Lopes

Pintura digital é uma técnica de ilustração utilizada por artistas para a criação de suas pinturas no computador. O ilustrador tem acesso a uma tela virtual e a ferramentas digitais, como pincéis que simulam diversos tipos de texturas de tintas como óleo, aquarela e acrílica. Além disso, alguns instrumentos, somente presentes no computador, possibilitam efeitos diferentes das pinturas tradicionais feitas à mão, como o “conta-gotas” e ferramentas que possibilitam alterar nitidez, brilho e contraste. É uma técnica muito prática para os momentos de criação.

Em 1972, surgiu o software SuperPaint, marco importante para a evolução da técnica de pintura digital, pois foi o primeiro programa capaz de criar traços mais limpos, eliminando o serrilhamento, que é produzido quando se cria uma linha inclinada no computador. Por ser bastante versátil, a pintura digital passou a ser utilizada em diversas áreas da comunicação e das artes, como publicidade, jogos virtuais e ilustração de livros e revistas.

Uma das vantagens da pintura digital é poder corrigir um erro, acrescentar ou alterar algum traço durante qualquer etapa do processo artístico. Além disso, a variedade de texturas e ferramentas disponíveis provocou o surgimento de novas combinações de materiais e diferentes estilos de trabalho.

A pintura digital não substitui o tradicional desenho feito à mão. Trata-se de uma técnica inovadora de ilustração que convive com a prática do desenho feito à mão. Em ambos os casos, o valor do artista é o que garante a beleza e a qualidade da obra.

Citar como:
LOPES, Pedro Pereira. Kanova e o segredo da caveira. Ilustrações de Walter Zand. São Paulo: Kapulana, 2017 [Contos de Moçambique, v. 5].